“A ideia de modernidade é uma ideia de morte. Mas a morte branca é ruim, a morte preta é diferente. Na morte preta a gente consegue entender outras relações, consegue entender o contato com outros mundos. Mas a morte branca é só morte. Não há vida na morte. E pra gente não serve. Se é um moderno que só mata e não tem vida, não vale. Porque na morte preta há vida, ainda assim.”
Josicléa Pires da Silva, 24 anos, é uma das muitas vozes do quilombo Santa Rosa dos Pretos que se opõem à duplicação da BR 135 pelo DNIT (Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes) e também da Estrada de Ferro Carajás (EFC), da mineradora Vale.
Ela entende que esses empreendimentos são “a morte em vida”, são a modernidade branca que des-envolve, que secciona corpos vivos – árvores, igarapés, bichos e núcleos familiares – para assentar sobre eles centenas de quilômetros de asfalto e ferro inertes.
Para Josicléa, a modernidade branca é incapaz de dar bons frutos, porque seus projetos de progresso são como um tronco morto e vazio, sem a copa que beija e busca força no sol, e sem as raízes que o nutrem com água e o vinculam à terra.
No caso da duplicação da BR 135, a morte em vida apontada pela quilombola significa a extinção do próprio quilombo Santa Rosa dos Pretos, uma vez que o DNIT pretende eliminar 345 casas em um trecho de cerca de oito quilômetros que correspondem ao quilombo – praticamente a totalidade dos imóveis que são margeados pela BR, incluindo igrejas, terreiro de Mina, casa de farinha, clube comunitário, comércios familiares e pés de árvores frutíferas.
A morte em vida significa, ainda, a expulsão dos pretos e pretas de Santa Rosa das terras que ocupam há mais de três séculos, e a expulsão dos Encantados, entidades espirituais que são donas primeiras e atemporais do quilombo.
Se as estratégias coloniais de expropriação da terra e do corpo preto se perpetuam ainda hoje no quilombo, as estratégias de resistência dos quilombolas também emergem, e remontam às vivências de seus antepassados escravizados.